1.02.2009

Nº 1682 - Sexta-Feira 5 de Dezembro de 2008

Trabalhadores da Melco aceitam acordo
Governo autoriza redução de salários

A Melco/PBL, operadora de jogo em Macau, recebeu luz verde do Executivo da região para acordos com os trabalhadores de redução de salários devido à crise financeira mundial e às restrições ao turismo impostas pela China.
De acordo com Shuen Ka Hong, director dos Serviços para os Assuntos Laborais, a Melco/PBL apresentou ao Governo um plano de quatro pontos desde a redução do horário de trabalho com redução salarial proporcional, férias prolongadas não remuneradas, trabalho a tempo parcial e redução do horário de trabalho para croupiers com formação profissional.
O mesmo responsável disse que 90 por cento de 3.610 trabalhadores optaram pela redução salarial e apenas 49 do total de empregados ainda não responderam à proposta da empresa por se encontrarem ausente em férias ou licenças.
Shuen Ka Hong explicou também que menos de 10 por cento dos trabalhadores optaram pela formação, tempo parcial de trabalho ou férias não remuneradas.
“É uma boa proposta por causa da crise financeira”, disse o director que pretende garantir “emprego para os residentes” e que estes possam sobreviver.
O mesmo responsável acrescentou que parte dos trabalhadores, como não residentes, poderiam ser dispensados mas isso traria “problemas funcionais” à empresa por falta de pessoal.
Por isso, explicou, optou-se por dispensar alguns trabalhadores não residentes e reduzir o vencimento dos não residentes e dos residentes que ficaram ao serviço .
A proposta da Melco/PBL, que em Macau opera várias salas de slot machines e o hotel/casino Crown, na ilha da Taipa, é válida até Maio de 2009 e só abrange os trabalhadores da companhia e em todas as categorias, incluindo a administração que também aderiu ao plano de redução salarial.
Já os trabalhos de construção do complexo City of Draems, nos aterros entre as ilhas da Taipa e de Coloane, não serão, para já, afectados e a companhia está obrigada a repor os vencimentos no final do prazo de validade da proposta ou a apresentar nova justificação para manter as condições.
Shuen Ka Hong disse também que a proposta da Melco/PBL é razoável numa altura de incerteza devido à crise financeira e porque protege o emprego em vez de despedir trabalhadores colocando em dificuldades muitas pessoas.
Além da crise financeira, a proposta da Melco/PBL não será também alheia à limitação chinesa aos vistos de turismo para Macau que fez cair as receitas dos casinos numa média mensal de quase 200 milhões de euros bem como os resultados da companhia que na segunda metade do ano iniciou uma série de quebras de receitas brutas e de quota de mercado.
Sobre planos de contenção de outros operadores, Shuen Ka Hong disse apenas que qualquer proposta será analisada caso a caso.

Congresso da APAVT encerra com críticas ao governo de Lisboa
Oportunidade desperdiçada

O presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagem e Turismo acusa Lisboa de não ter aproveitado uma oportunidade única para promover a imagem de Portugal na região.

Rui Cid

Um discurso para consumo interno. Apesar de estar em Macau, as palavras de João Passos, presidente da APAVT, na cerimónia do encerramento do congresso que a Associação promoveu no território ao longo da semana, foram direccionadas, sobretudo, para Lisboa. Mais concretamente para os gabinetes do palácio de São Bento. De facto, o Executivo liderado por José Sócrates foi alvo de duras críticas por parte de João Passos, que não gostou que ninguém do governo da República se tivesse deslocado ao território para assistir ao Congresso. Uma ausência que o líder da APAVT considera "incompreensível e um desaproveitamento de uma oportunidade de promover Portugal em Macau".
"O turismo constitui, sem margem para dúvida, a principal actividade exportadora de Portugal. Como tal necessita de especial atenção na sua promoção e comercialização. Entendemos que é absolutamente indispensável uma cooperação entre o público e o privado que não tem existido. Veja-se a falta de visão estratégica do Governo, ao não tirar partido da realização deste congresso como um evento que, pelo seu peso especifico, constituiu uma verdadeira acção promocional de Portugal nestas paragens", argumentou João Passos.
Mas, se as criticas ao governo da República foram nota dominante no discurso de encerramento do XXXIV Congresso da APAVT, os elogios a Macau não foram descurados, tendo sido mesmo proposta, a breve prazo, a realização de um ano de Portugal na RAEM. João Passos, que fez um balanço "francamente positivo" da passagem pelo território, considerou que Macau tem todas as condições para ser divulgada em Portugal de forma a que os operadores turísticos "possam trabalhar em força para trazer portugueses para cá e tentar, através desta porta, levar chineses para Portugal".
O líder da APAVT acredita que o número visitantes oriundos da Republica pode aumentar dentro de algum tempo, mas avisa que "será preciso ter alguma paciência" até que o "destino Macau possa ser vendido com sucesso".
"Eventualmente teremos que solucionar o problema das ligações aéreas, mas esse é um trabalho que será feito agora. Trouxemos muita gente cá - 420 pessoas, entre congressistas e acompanhantes - que irá, certamente, fazer a sua promoção boca a boca. A partir daqui, está lançado o trabalho e com certeza que nós nos empenharemos a tentar divulgar e a trazer gente cá."

Ao Man Long foi detido há dois anos. Consequências do maior escândalo político da RAEM
As oportunidades que Macau não soube aproveitar

Já lá vão dois anos, mas o assunto continua bem presente na memória colectiva de Macau. O ex-secretário dos Transportes e Obras Públicas foi condenado a 27 anos de prisão em Janeiro passado, mas nem por isso o escândalo em que esteve envolvido foi enterrado. O PONTO FINAL foi tentar perceber que consequências teve o caso mais polémico da curta vida da RAEM. E descobriu que, acima de tudo, se desperdiçou uma oportunidade para melhorar o sistema. E em diversas frentes.

Isabel Castro

Faz hoje precisamente dois anos que o então secretário para os Transportes e Obras Públicas anunciou as obras de ampliação do Aeroporto Internacional de Macau. Ninguém imaginava que o plano de remodelação da infra-estrutura seria o seu último anúncio público. E que no dia seguinte, 6 de Dezembro de 2006, iria ser detido na sua residência oficial.
A notícia chocou o território e não só. Levou a RAEM ao mundo pelas piores razões. O envolvimento de um alto governante num escândalo de corrupção não favorece a imagem de território, mais a mais atendendo à dimensão reduzida da equipa do Executivo local e ao momento que então se vivia, com a captação de investimentos estrangeiros e a construção de grandes empreendimentos.
Mais de um ano depois, o Tribunal de Última Instância condenou Ao Man Long a 27 anos de prisão efectiva. Aos 51 anos de idade, o ex-governante foi considerado culpado de 57 dos 76 crimes que lhe tinham sido imputados, a maioria deles de corrupção passiva e branqueamento de capitais. A pena em cúmulo jurídico é a mais gravosa de que há memória em Macau e foi considerada por muitos como sendo exagerada, atendendo a que praticou crimes económicos e não de sangue.
Entre a detenção de Ao e o seu julgamento, foram-se levantando várias questões: algumas de ordem jurídica, outras relacionadas com aspectos práticos das áreas que tutelava, sendo que se sentiu ainda impacto ao nível político, com notórias consequências para a imagem do Governo e a sua credibilidade junto da opinião pública.
Nem depois de o sistema ter castigado o antigo governante o assunto foi arrumado. Para começar, Ao Man Long deverá ser julgado outra vez. O PONTO FINAL sabe que já está em fase adiantada o segundo processo relacionado com o ex-secretário, que implica novos arguidos no caso. Além disso, de lá para cá, verificaram-se mais episódios nos tribunais relacionados quer com o caso do antigo governante, quer com outros arguidos de processos conexos.
Ao nível decisório nas Obras Públicas, os processos abrandaram. Ainda esta semana vários deputados alertaram o Governo para o problema. Em termos de imagem, o Executivo parece ainda não ter recuperado. O mais provável é que já não tenha tempo nem condições para o fazer. Ao Man Long está preso em Coloane, mas bem presente na vida da RAEM.

Um dia com duas surpresas

Foi um dia, no mínimo, inesquecível. E também particularmente atribulado, em nada semelhante ao do quotidiano de uma redacção de Macau. A manhã de 7 de Dezembro de 2006 começou de forma incaracterística para muitos jornalistas do território. O telefone tocou ainda não eram 9h00, com a mensagem de que o Chefe do Executivo ia dar uma conferência de imprensa, nessa manhã, no Palácio do Governo.
Não fosse o facto de Edmund Ho convocar os órgãos de comunicação social apenas uma vez por ano e o acontecimento não seria de espantar. “Como todos nós sabemos, o Chefe do Executivo fala só aquando da apresentação das Linhas de Acção Governativa”, recorda ao PONTO FINAL o delegado da Agência Lusa em Macau, José Costa Santos. “Foi a primeira surpresa da manhã”, acrescenta Gilberto Lopes, chefe da Rádio Macau, do canal português.
Já na Sede do Governo, a noção de que algo grave se passava era sentida por todos. “Estavam lá jornalistas de todos os órgãos de comunicação social de Macau. Imaginámos logo que algum secretário iria ser substituído, não sabíamos era porquê”, conta José Costa Santos. Gilberto Lopes recorda-se que o nome de Ao Man Long chegou a ser mencionado.
Quando o Chefe do Executivo apareceu na sala, acompanhado pelo Comissário Contra a Corrupção, Cheong U, foi imediata a noção de que se estava perante um momento de crise. “Percebemos que alguém tinha sido preso e que era um membro do Governo. O Chefe do Executivo não ia falar à imprensa por causa de um director de serviços”, diz o delegado da agência portuguesa de notícias.
Edmund Ho parecia “não ter pregado olho” a noite inteira. Não era para menos. À imprensa, o principal responsável pelo Governo de Macau comunicou que Ao Man Long tinha sido detido por alegado envolvimento num caso de corrupção. A detenção tinha ocorrido durante a noite anterior, por volta das 22 horas.
O Chefe do Executivo explicou também que Ao tinha sido já sido exonerado das suas funções numa proposta apresentada e imediatamente aprovada pelo Governo Central, em Pequim. E adiantou que outras “personalidades” estavam também envolvidas. A investigação contou com a colaboração das autoridades contra a corrupção da antiga colónia britânica.
“Foi a segunda surpresa do dia, ninguém estava à espera que fosse detido”, contextualiza Gilberto Lopes. O facto de o Governo ser de constituição reduzida contribuiu para aumentar a dimensão do caso. “É verdade que se ouvia por aí, nalguns circuitos, que havia algo de complexo com a pessoa em causa”, acrescenta o jornalista da Rádio Macau. Ainda assim, foi um choque. “A verdade é que ninguém estava à espera”, reforça José Costa Santos.
A gravidade da notícia fez com que a emissão normal da Rádio Macau tivesse sido interrompida. Alguns jornais de Macau, que não iam sair para as bancas no dia seguinte, publicaram edições especiais sobre o escândalo. Vivia-se o momento político mais melindroso da vida da RAEM.

As falhas do sistema

Se na dimensão política o caso não foi simples, em termos jurídicos não o foi menos. Pormenores processuais à parte, o caso Ao Man Long há-de ser para sempre recordado não só pela dura pena de prisão, mas também pelo facto de não ter tido direito a recorrer da decisão judicial, embora tivesse sido julgado em primeira instância pelo TUI, por se tratar de um titular de um alto cargo político.
O antigo governante não pôde usufruir do direito a, pelo menos, um grau de recurso, ao contrário, por exemplo, dos seus corruptores. Colocaram-se questões jurídica complexas, relacionadas com a competência do tribunal superior da RAEM e também com o número de juízes que o compõem.
O TUI pode ter uma formação alargada a cinco juízes – mais dois do que o colectivo que julgou o ex-secretário – mas a Lei de Bases da Organização Judiciária não dotou esta composição de competências para avaliar recurso de caso que o Tribunal conhece em primeira instância.
Ainda durante o julgamento, num despacho de admissibilidade de um recurso interposto pela defesa de Ao Man Long, Viriato Lima, um dos juízes do colectivo que julgou o processo, sustentou não haver possibilidade de apelo no caso em questão, fazendo uma interpretação da Lei de Bases de Organização Judiciária que mereceu reparos de vários advogados de Macau.
No despacho, e embora dissesse respeito a uma questão levantada durante o julgamento, o TUI avisou logo que, se a defesa pretendesse recorrer da decisão final, a resposta seria a mesma, ou seja, não haveria margem para a interposição de recurso do acórdão do tribunal.
Esta aparente lacuna na lei – que resultou, na realidade, de uma decisão política tomada em 1999, antes da entrada em vigor da legislação – levou vários juristas e deputados a defenderem a revisão do diploma que define o funcionamento dos tribunais da RAEM, sugerindo ainda o aumento do número de juízes. Volta e meia, ouvem-se vozes nesse sentido, mas a verdade é que, tanto quanto é do domínio público, não há planos para rever a lei orgânica nem para dilatar o número de magistrados judiciais.
Ainda esta semana, provou-se ser necessário fazer algo para resolver os imbróglios do sistema: por não haver juízes sem impedimento para julgar no TUI, o tribunal superior de Macau teve que recorrer à Segunda Instância para poder decidir da admissibilidade dos recursos apresentados pelo Ministério Público e por quatro arguidos (três familiares de Ao Man Long e o empresário Frederico Nolasco da Silva), num dos processos conexos ao do antigo secretário. Como a Segunda Instância também tinha quatro magistrados judiciais impedidos (por terem, tal com os do TUI, tomado já decisões no âmbito dos casos em questão), a única solução foi recorrer à Primeira Instância, verificando-se assim uma caricata subversão da hierarquia do sistema.

Tudo na mesma, ou pior

Para Nuno Simões, advogado de Ao Man Long, toda esta experiência pela qual passaram os tribunais da RAEM “deveria ter tido muitas mais implicações do que teve”. O advogado sublinha que, não obstante os dois anos volvidos do início do caso, “nada foi feito”.
E justificava-se outra postura. A dimensão política do processo fez com que a opinião pública estivesse particularmente atenta ao desenrolar do caso. O julgamento de Ao trouxe o Direito Penal para os jornais, houve um debate sobre matérias jurídicas na praça pública que há muito não se via.
“Aparentemente, Ao Man Long vai ser julgado outra vez. Podia ter sido aproveitada a oportunidade, mas nada foi feito”, afirmou ao PONTO FINAL. “Terá o mesmo problema no segundo julgamento que teve no primeiro.”
Simões frisa que “quer o Governo, quer a Assembleia Legislativa deviam estar preocupados, em primeiro lugar, com os direitos dos arguidos”. O advogado recorda que a Lei Básica define que “os direitos dos cidadãos são fundamentais”. Há uma hierarquia de valores no ordenamento jurídico da RAEM que dá primazia aos cidadãos e à defesa dos seus direitos.
“Na sequência do processo, a única coisa de que se falou foi em aumentar os poderes do Comissariado contra a Corrupção (CCAC)”, analisa o causídico. O órgão de policia criminal anunciou a pretensão de alargar o leque das suas competências ao sector privado, um desejo que deverá ser realizado muito em breve. Há três semanas, o Chefe do Executivo da RAEM anunciou que a proposta de lei nesse sentido deverá ser entregue à Assembleia Legislativa (AL) nos primeiros meses do próximo ano.
A actuação do CCAC na esfera privada desagrada de sobremaneira a alguns sectores locais, com destaque para os advogados, que recordam que o órgão criminal responde directamente ao Chefe do Executivo. Nesta história em que Ao Man Long apareceu com o papel do lobo mau e o CCAC vestiu a pele do lenhador (realçando a presença em Macau pela investigação que levou a cabo e sendo condecorado por Edmund Ho pelo sucesso alcançado no caso), o órgão liderado por Cheong U não saiu totalmente vitorioso.
Recorde-se que o advogado do empresário Pedro Chiang, João Miguel Barros, apresentou duas queixas-crime por entender que o CCAC não respeitou o segredo de justiça. Ainda assim, parece que o lenhador vai ter um machado de maiores dimensões no futuro.

O que Edmund Ho perdeu

Mas nesta história também entra a Bela Adormecida. É assim que a Administração – ou, pelo menos, parte dela, se tem comportado desde o escândalo do ex-secretário. O recado deixado esta semana pela presidente da Assembleia ao sucessor de Ao Man Long é inequívoco. Susana Chou aconselhou Lao Si Io a não ter medo de receber empresários e explicou que tal não é sinónimo de corrupção. É que o governante esquiva-se às audiências com os investidores. E é criticado, pelos deputados, pela forma como (não) actua.
Os serviços que tutela não gozam, neste momento, de melhor fama, sobretudo no que às Obras Públicas diz respeito. São frequentes as queixas oriundas do sector da construção civil, de arquitectos, de investidores: não se despacham processos, um facto que esteve em relevo esta semana no debate das Linhas de Acção Governativa na AL.
Eric Sautéde, professor de Ciência Política no Instituto Inter-Universitário de Macau (IIUM), confessa que esperava que o caso Ao “tivesse impactos maiores e mais profundos” no modus operandi de Macau. O escândalo deu lugar a “um período em que se vive com muito cuidado”. A Administração sentiu a necessidade de recuperar a face e “é por isso que tudo tem vindo a ser adiado, aumentando a ineficiência”.
O resultado está à vista, conclui o politólogo: “O Governo não ganhou a confiança da população, porque tem sido muito lento a reagir, demasiado cauteloso e nada assertivo”.
Os episódios negativos podem ter consequências positivas. Mas parece que tal não se verificou na RAEM. “Não foi uma tragédia, mas foi uma experiência traumática. Isto demonstrou que era necessário que algo acontecesse. Mas em vez de se aproveitar para se levar a cabo uma mudança, optou-se pela cautela, pela segurança, pelo silêncio”, nota Sautéde.
O docente do IIUM diz estar “um pouco desiludido”. Esperava uma reacção que não aconteceu de um Governo que foi, por diversas vezes, avisado das suas insuficiências. Eric Sautéde traz à memória as manifestações de 2006 e 2007. “Pelo meio, houve o escândalo de Ao Man Long. Em ambas, houve cidadãos que se manifestaram a favor da demissão de Edmund Ho.”
Criou-se em Macau “a sensação de que todo o Governo tinha alguma responsabilidade política, pelo que se sentia necessidade de demonstrar a sua transparência e honestidade”. O politólogo estava à espera de que estas “sensações” da população merecessem uma resposta da equipa governamental, “uma nova atitude”. Sobretudo do Chefe do Executivo.
“Antes do caso Ao Man Long, Edmund Ho era visto como uma espécie de tio, as pessoas gostavam dele. Agora, não ouço ninguém dizer coisas agradáveis sobre o Chefe do Executivo”, constata. “Esperava que tentasse tornar-se mais próximo da população, porque tem um lado humano forte. Em privado é uma pessoa fantástica”, salienta.
Por isso, Sautéde estranha o seu “afastamento”. Poderia ter, após o escândalo, “mostrado a sua liderança e aproximar-se das pessoas, mas isso não aconteceu”. Resumindo: “Edmund Ho perdeu uma oportunidade para demonstrar que, do ponto de vista político, estava acima de tudo isto”.
E assim se conclui que nem sempre o que começa mal pode ter um final feliz.

A curiosa vida dos gondoleiros do Venetian
Os navegadores de sonhos

São viagens curtas, mas transportam o viajante para Veneza, cidade europeia conhecida pelo seu romantismo. Pelo menos, é o que garantem os gondoleiros que trabalham no hotel-resort Venetian. O PONTO FINAL foi conhecê-los e saber mais sobre estes percursos musicais de gôndola.

Luciana Leitão

Fechando os olhos por alguns segundos, quase que é possível viajar até Veneza. E imaginar que se está naquela cidade labiríntica e enigmática, que transpira a romance. Abrem-se os olhos... e realidade sobrepõe-se. O que se vê são diferentes lojas, das mais conhecidas marcas, enquanto se circula num barco mais estreito e pequeno do que uma gôndola, conduzido por um italiano – ou estrangeiro com uma qualquer ligação ao país da bota -, que entoa canções tradicionais. O PONTO FINAL entrou no mundo da fantasia, circulou numa gôndola e conheceu os homens que cantam “O Sole Mio”, nos canais do Venetian, em Macau.
Trajado a rigor, debaixo do céu pintado de um azul intenso do hotel-resort Venetian, durante dez minutos, Vincente, um italiano natural de Trento, de pé, na parte traseira da gôndola, move suavemente o braço para dar o impulso necessário ao remo. Baixando-se ligeiramente quando se depara com uma ponte, vai cantando “Noel, Noel”, ao mesmo tempo que conduz o barco. Calmamente, a sua voz potente e afinada ecoa pelo Grand Canal, enquanto os visitantes páram, por momentos, apenas para contemplar Vincente. O impacto da sua presença é tremendo e ninguém fica indiferente.
Pela sua gôndola já passaram pessoas de várias nacionalidades – dos filipinos aos chineses, passando por indivíduos de vários outros pontos da Ásia. “Nunca imaginei estar aqui, é um emprego muito bom e uma experiência engraçada”, conta, explicando, ao mesmo tempo, que “se diverte quando fala sobre o seu emprego com os familiares e amigos” ainda radicados em Itália.
Da música de Natal ao O Sole Mio, Vincente não se poupa a esforços por proporcionar uma boa viagem, sempre com uma absoluta serenidade, como se tivesse crescido a conduzir aquele veículo. “A diferença entre os gondoleiros do Venetian e os de Veneza é que estes últimos, normalmente, não cantam. Nós cantamos sempre”, explica, sorrindo. Seja como for, importante para este condutor são as recordações que as viagens diárias lhe trazem, transportando-o, temporariamente, para a sua terra de origem. “Faz-me lembrar o meu país, porque parece mesmo autêntico”, vinca.

Ser italiano é uma vantagem

Aos 24 anos, Luciano, natural de Cosenza, Itália, é gondoleiro no Venetian há um ano. O treino, declara, foi intensivo. Durante dez anos, não fez mais nada senão preparar-se para ser gondoleiro, diz, enquanto ri. “Estou a brincar. Preparei-me durante uns tempos”, afirma, agora já com um ar mais sério.
Divertido, com um sotaque italiano, enquanto se expressa em inglês, Luciano afirma que “ser italiano” jogou a seu favor, na hora de se candidatar ao emprego”.
Entusiasmado com o emprego, Luciano não se cansa de enumerar as suas qualidades. “Dá-me a oportunidade de conhecer muitas pessoas e praticar as diferentes línguas, inclusivamente, o mandarim” que este italiano quer aprender. Depois de já ter estado algumas vezes em Veneza, Luciano reconhece que “se trata de uma experiência diferente”. O formato do barco é diferente, até porque os canais também são mais estreitos do que os de Veneza.
Independentemente das diferenças, Luciano garante que “leva muito a sério o seu trabalho” e que quer, através do seu desempenho, “mostrar o seu respeito pela tradição [de Veneza]”.
Daniele também é italiano e trabalha como gondoleiro no Venetian há já cinco anos. Primeiro, em Las Vegas, e depois transferiu-se para Macau.
Inquirido sobre as nacionalidades dos restantes colegas, o jovem de 25 anos garante que “ser italiano – ou parte italiano – é sempre uma vantagem” para quem se quer candidatar ao emprego.
Não tendo nascido muito longe da verdadeira Veneza, garante que, no geral, os cenários “são muito semelhantes”, mas apercebe-se de algumas diferenças. “Uma delas é que, em Itália, os gondoleiros raramente cantam”, diz rindo, acrescentando que o “Venetian é, naturalmente, mais pequeno que Veneza e a forma como as gôndolas são conduzidas também é diferente”. Quanto às diferenças entre Las Vegas e o território, garante que o Venetian-Macau “não tem tantos visitantes como o Venetian da cidade norte-americana”.

O romantismo do Venetian

Salientando que muitas pessoas que se deslocam a Veneza fazem-no em busca de romantismo, Luciano reconhece que isso também acontece, esporadicamente, no Venetian-Macau. Aliás, recorda-se de um episódio bastante divertido, quando um homem quis pedir em casamento a namorada em pleno passeio de gôndola. “Cantei e todos os gondoleiros estavam alinhados e tinham um ramo de flores. Foi especial”, conta.
Aliás, Daniele afirma que no Venetian de Las Vegas esses pedidos de casamento – ou mesmo, casamentos – ocorriam com frequência, ou não fosse a cidade conhecida pela sua facilidade em realizar matrimónios.
Quanto às provas que ambos tiveram de prestar para se tornarem gondoleiros, incluía “cantar algumas músicas tradicionais”, além de um teste para perceber se conseguem conduzir o barco e, finalmente, aquilo que chamam o “teste do salto”, diz Luciano, explicando que se trata de perceber se, caso o gondoleiro cair à água, consegue facilmente voltar à gôndola. “Em Las Vegas a água tinha a profundidade de três a cinco metros. Aqui é só de um metro e, se calhar, não faz tanto sentido”, explica Daniele.
Trabalhando diariamente no interior do Venetian, Daniele afirma que sob o céu pintado a azul do Grand Canal “parece sempre que são 17h00”, preferindo, por isso, estar nessa zona durante a noite, porque as luzes são mais fracas. Contudo, como em tudo na vida, “uma pessoa habitua-se”, declara.

Os truques do ofício

Ser italiano ou parcialmente italiano é uma vantagem. Ou ter uma qualquer ligação a esse distante país europeu. É o que garante o gerente, Anton Kuhlmann, explicando que “ser capaz de cantar, no estilo clássico” é também um traço importante para um candidato ao cargo, características que têm de ser combinadas com uma personalidade “extrovertida e agradável”, já que terá de interagir com o viajante. Eis os requisitos para navegar, diariamente, nos canais do Venetian, entretendo pessoas de todos os cantos do mundo que querem, por momentos, desfrutar da paisagem quase veneziana.
De acordo com o gerente-sénior dos gondoleiros e da atmosfera de rua do Venetian, Guy Lesquoy, os funcionários que encarnam a personagem tão típica de Veneza são “de diferentes nacionalidades”, mas “ser italiano ou parcialmente italiano é uma vantagem”. E constitui uma componente importante da diversão proporcionada pelo Venetian. “É muito popular. Os indivíduos do Continente gostam muito da viagem de gôndola, por exemplo”, diz.
Aliás, “os canais são muito venezianos e as pessoas costumam desfrutar muito da experiência”, à qual, normalmente, se aliam, “as animações de rua”, tentando-se que “seja o mais semelhante” possível à experiência em Itália. “Os canais foram concebidos para proporcionar a mesma sensação que se tem em Veneza”, remata.

Ambientes distintos

Além de não se poder vislumbrar o céu de Itália, há, contudo, diferenças notórias entre os ambientes de Veneza e do Venetian. “Os barcos são mais pequenos, próprios para circular nos canais que também são mais estreitos”, sem esquecer que “aqui rema-se na parte traseira do barco”, explica Anton.
Uma das diferenças mais flagrantes entre os originais gondoleiros e os do Venetian refere-se às capacidades vocais. “Os de Veneza não cantam”, diz, explicando que é necessário que saibam entoar músicas tradicionais como o O Sole Mio, Santa Lucia, entre outras tantas sobejamente conhecidas.
Conforme explicou Anton, entre os 65 gondoleiros é difícil dizer o número exacto de profissionais que não têm qualquer ligação a Itália. “Alguns nasceram e cresceram lá, outros não cresceram lá, há quem seja apenas parcialmente italiano”, diz. “Mas a grande maioria tem uma ligação grande a Itália”, contrapõe Guy Lesquoy.
E, garantem ambos, estes gondoleiros são bem mais simpáticos do que os de Veneza. “Aliás, o de Veneza é, normalmente, equiparado ao taxista”, diz rindo.

A preparação

Antes de começar a remar nos canais do Venetian, os gondoleiros são submetidos a um período de treinos intensivos que duram entre três semanas a um mês. “Têm de aprender a conduzir o veículo tão bem como andam”, diz Anton, ao que Guy Lesquoy esclarece que não é “assim tão fácil de manobrar”, ainda para mais tendo em conta que “têm de cantar ao mesmo tempo e interagir com as pessoas”.
É importante também que “estudem de forma a ter conhecimentos detalhados sobre Veneza”, até para “responder a eventuais questões que os viajantes queiram colocar”, acrescenta Anton. No fundo, acaba também por assumir o papel de “guia turístico”, já que as pessoas, muitas vezes, acabam por aproveitar esta oportunidade para “saber mais sobre Veneza”.

As semelhanças

Tal como em Veneza, muitos dos viajantes de gôndola do Venetian são casais apaixonados. Inclusivamente, o hotel-casino proporciona um serviço especial a quem queira pedir em casamento a sua amada (ou amado, claro). “Algumas pessoas pedem-nos para organizar pedidos de casamento”, diz Guy Lesquoy, explicando que os gondoleiros se juntam, cantam e têm ramos de flores. “Uma experiência muito romântica”, vinca.

Mulheres ao volante

Quanto aos gondoleiros, “50 por cento são do sexo feminino”, algo que não se vê em Veneza. “Em Itália é uma tradição que passa do pai para o filho”, esclarece Anton Kuhlmann, sendo, por isso, difícil contrariar a tradição.
Para quem estiver interessado em desfrutar da experiência, Guy Lesquoy lembra que os passeios de gôndola realizam-se de domingo a quinta-feira, entre as 10h00 e as 23h00, enquanto nas sextas e sábados se prolongam até à meia-noite.

L.L.


Editorial

Oportunidades

O tom optimista com que o presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagem e Turismo se despediu de Macau levaria os mais ingénuos a acreditar que agora é que este território vai cumprir o seu ideal e transformar-se na tal placa giratória de que se fala há tantos anos.
No entender daquele responsável, estarão criadas as condições que a imagem de Macau possa ser divulgada em Portugal, permitindo que os operadores do sector possam trazer mais turistas portugueses ao território e vice-versa.
Claro que esse sonho ainda vai levar algum tempo, porque há alguns pequenos problemas - questões de pormenor, tudo indica - por resolver. Entre eles, um detalhe de menor importância que é a ausência de ligações aéreas directas entre Lisboa e esta zona do mundo.
Talvez seja bom lembrar também que esta foi a quarta vez que os operadores turísticos portugueses vieram passear até Macau, a pretexto de aqui realizarem o seu congresso anual.
Os resultados de tão grande empenho, como mostram as estatísticas ao longo dos últimos anos, estiveram sempre longe das intenções manifestadas nos discursos e nas intervenções dos participantes.
Não se percebe qual a razão para as coisas sejam diferentes nem se vislumbra quais são as tais condições que agora garantem um futuro risonho para o aumento do fluxo de turistas.
Se ainda houvesse dúvidas quanto à escassa importância que Macau tem, na estratégia de captação de turistas para o mercado português, o facto de nenhum representante oficial do governo de Lisboa se ter dignado a participar neste congresso demonstra a distância entre a realidade e as boas intenções. Que, por melhores que sejam, raramente passam disso.

Paulo Reis

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