10.28.2008

Eleição para Chefe do Executivo’2009 - II

"Quem é Quem" na corrida à sucessão

Bruce Kwong

Dentro de 14 meses o Chefe do Executivo, Edmund Ho, completará o seu segundo e último mandato. O seu sucessor será anunciado em Julho ou Agosto do próximo ano, mas muito antes dessa data o olhar do público - e dos outros políticos - estará voltado para os possíveis candidatos. Todas as atenções estarão centradas no desenrolar do processo de selecção, em especial no passado político, ideologia, experiência administrativa, e estilo de governação de cada possível sucessor. À medida que a sua capacidade efectiva de governação se for apagando, à entrada de 2009, o governo de Edmund Ho irá gradualmente adoptando uma postura de esperar para ver. Quem se seguirá como CE? Será esta a questão mais relevante, tanto para o governo central como para os cidadãos de Macau.
A escolha do novo CE é uma matéria que respeita não só ao Comité de Selecção, mas também ao governo central e à Lei Básica. Os candidatos que pretenderem qualificar-se para uma fase de indigitação terão de ser, em princípio, apoiados pelo governo Central e bem aceites pela população (ser apoiado, deve aqui ser entendido como "endossado").
As primeiras eleições para os Chefes de Executivo de Hong Kong e Macau revelaram que o critério do governo Central para endossar um candidato foi este possuir sólidas ligações familiares a personalidades chave na China, experiência de serviço no Conselho Executivo e boas relações de amizade com os líderes chineses.
Embora nas segundas eleições dos CE de Macau e Hong Kong esta política se tenha mantido inalterada, desta vez o mecanismo pode já não ser válido, caso exista uma mudança no núcleo de liderança na China.
Dito isto, e embora os novos líderes chineses Hu-Wen tendam a ser mais realistas e pragmáticos - uma tendência que se pode observar desde a pneumonia atípica, aos vários escândalos de corrupção massiva dos últimos anos, ao nível dos membros seniores do partido - uma mudança ao nível da liderança do governo central, não implica uma mudança fundamental no processo de selecção do Chefe do Executivo, sendo no entanto de esperar alguma alteração.
Para conseguir combinar o pragmatismo político da nova liderança com a prática rígida dos princípios do partido, o novo CE deverá preencher alguns pré-requisitos: em primeiro lugar deverá ser uma individualidade de grande confiança do governo central; idealmente terá mesmo passado por um processo de escrutínio sobre a sua lealdade e atitude politicamente correcta.
Em segundo lugar deve possuir um alto índice de popularidade, significando que terá de ser universalmente aceite pelos seus constituintes.
Em terceiro lugar deverá ter um sólida formação académica providenciada, de preferência desde a infância, por instituições ligadas à China, possuindo ainda um certificado universitário de origem estrangeira indicador da sua visão do mundo.
Em quarto lugar, deverá ter ligações fortes a organizações políticas governamentais da China - quanto mais alto o nível governamental, maiores as hipóteses de ser seleccionado.
Em quinto lugar, deve ser descomprometido em relação ao sector dos negócios, constituindo um factor negativo ter ligações próximas aos grandes magnatas do mundo empresarial.
Em sexto lugar deve possuir comprovadas capacidades de gestão no sector público. Sétimo e mais importante, deve ter uma história pessoal limpa e transparente, garantia de um mandato sem escândalos.
Tendo em conta estes pré-requisitos, os qualificativos para CE podem ser agrupados em quatro elementos principais, a saber: confiança política, popularidade local, capacidade administrativa e um passado limpo.
Quanto ao primeiro elemento, será mais fácil ao governo Central encontrar um candidato de confiança, avaliando a sua ideologia política, se este ocupar uma posição oficial no sistema político do Continente, como por exemplo se for membro da Conferência Política Consultiva do Povo Chinês ou da Assembleia Nacional Popular.
Em relação ao segundo elemento, a popularidade local pode ser testada através de inquéritos regulares, o que não é prática usual em Macau. A melhor forma de um candidato adquirir popularidade é ir ganhando o máximo de exposição pública que puder, quer liderando uma qualquer associação social, quer patrocinando actividades comunitárias, quer participando em acções de caridade, quer ainda mantendo uma boa relação com a imprensa. Qualquer um destes objectivos não são difíceis de atingir se o candidato estiver disposto a neles investir os seus recursos.
Quanto ao terceiro elemento, a melhor forma de demonstrar capacidade administrativa é ocupando um lugar no gabinete político do governo. Este lugar tanto pode ter a forma de serviço público, como de nomeação para membro do Conselho Executivo. A experiência do antigo CE de Hong Kong, Tung Chee Wa, e do actual CE de Macau, Edmund Ho, como membros do Conselho Executivo e Assembleia Legislativa antes de serem Chefes do Executivo lança o seguinte precedente: o candidato ideal pode provir das fileiras desses orgãos políticos da RAEM mesmo que nunca tenha sido um alto responsável da função pública. No entanto, possuir um currículo nas altas patentes do funcionalismo público, como acontece com o actual Chefe do Executivo de Hong Kong, Donald Tsang, será certamente uma vantagem.
O quarto elemento é crucial, já que a luta contra a corrupção constitui um dos núcleos duros da política do governo Hu-Wen. Quem quiser receber a benção do governo central deve essencialmente ser capaz de demonstrar uma capacidade de liderar de forma limpa e incorrupta. Para preencher esta premissa, qualquer candidato pertencente ao sector empresarial terá de fazer um esforço suplementar para conseguir convencer da sua imparcialidade, integridade e crédito.
Ter um historial como funcionário público ou em actividades comunitárias pode ser favorável, já ser político ou empresário não constitui vantagem na campanha para ocupar a cadeira de Chefe do Executivo.
Estes critérios de selecção podem ser facilmente aplicados em retrospectiva na explicação das nomeações tanto do antigo, como dos actuais CE de Hong Kong e Macau. Tendo como bons estes pré-requisitos na explicação da escolha do CE ideal, por parte do governo central, podemos usá-los para avaliar os seguintes eventuais candidatos a CE, na campanha eleitoral de 2009.

José Chui Sai-peng foi visto como um dos mais prováveis sucessores de Ho, sobretudo antes do início de 2007, altura em que a sua popularidade começou a decrescer. Pertencente à elite local, formou-se em engenharia nos EUA. Foi nomeado para diversos cargos na China, entre os quais o de membro do CCPCC de Cantão, e o de membro da ANP. Faz parte de organizações chave locais, entre as quais a Associação Comercial de Macau, e é deputado nomeado à Assembleia Legislativa da RAEM. Apesar disso, Chui Sai-peng esteve envolvido numa série de projectos de construção, incluindo o projecto da Praça do Tap Seac e outros, durante a passagem de Ao Man Long pelo governo. Talvez em virtude de um passado familiar proeminente e da sua reputação profissional, foi visto durante muito tempo como um dos mais prováveis sucessores de Ho em 2009. No entanto a existência de uma rede invisível de subornos na área da construção e dos projectos de engenharia, notabilizada pelo escândalo à volta de Ao Man Long, minaram a sua popularidade e carisma pessoal a ponto de não se poder falar já dele como candidato provável, nem sequer como principal candidato a uma surpresa no processo de selecção.
Na realidade, as expectativas em relação à sua possível candidatura podem ter sido apenas um verdadeiro mal-entendido, já que ele apenas reúne um pequeno conjunto de pré-requisitos.

Ho Iat-seng, com um perfil extremamente discreto na arena política, é agora considerado uma das apostas mais seguras para a eleição de 2009.
Nasceu em Macau e recebeu formação superior na China, já para não falar da sua nomeação como membro do Comité Permanente da Assembleia Nacional Popular, o que representa um sinal positivo particularmente significativo por parte do governo Central.
Tal como acontece com Edmund Ho e Tung Chee Hwa, diz-se que o seu pai desempenhou um papel importante na China Comunista, em especial durante o período da política de isolamento, o que ajudou a sua família a criar uma relação especial com o governo central. Ho Iat-seng é também membro do Conselho Executivo o que lhe possibilita ganhar visibilidade e acumular experiência governativa. O seu low profile dá-lhe actualmente uma vantagem especial: torna-se mais difícil ter "má imprensa".
A sua única desvantagem são as ligações ao sector empresarial. É aí que reside a incerteza do seu futuro.

Cheong U, Comissário Contra a Corrupção, pode ser o candidato revelação na eleição de 2009. Embora não reúna todos os pré-requisitos, a sua carreira como funcionário público, uma imagem limpa, sem ligações ao sector dos negócios e o facto de estar ligado a uma instituição pública possuidora de boa reputação, quando comparada com outras, a par da prisão de Ao Man Long e família, que resultou num conjunto de condenações judiciais sem precedentes – tudo isso tem feito subir o seu crédito, tanto junto do governo central como da opinião pública.
Para Pequim, Cheong U pode ser a pessoa mais indicada para assegurar os princípios de um governo limpo e tolerância zero na corrupção, e a formação como funcionário público e uma reputação de lealdade, seriam garantias da implementação das políticas do governo central. Os seus conhecimentos limitados de gestão da indústria do jogo não afectarão as suas possibilidades de candidatura já que, como no caso de Ho, o governo central dar-lhe-ia instruções sobre como resolver os principais problemas.

Ho Chio Meng, a sua nomeação, após a transferência do exercício de soberania, para Procurador Geral do Ministério Público e o cargo de Vice-Alto Comissário contra a Corrupção e a Ilegalidade Administrativa ocupado antes daquela data, fazem dele um candidato com hipoteses num cenário pós-processo Ao Man Long.
É possível que a opinião pública deseje um CE justo e neutral, capaz de inverter uma percepção notória de corrupção existente na comunidade. No entanto, o seu passado judicial e um insuficiente "apoio" vindo do Norte, diminuem as suas hipóteses de eleição. Para além disso, a falta de pré-requisitos a nível do seu passado pessoal prejudica também a possibilidade de uma candidatura.

Sam Hou Fai, Presidente do Tribunal de Última Instância, é outro nome que subitamente surgiu na ribalta depois do caso Ao Man Long. No entanto, o seu currículo pessoal não preenche igualmente os pré-requisitos e é ainda demasiado jovem e inexperiente na arena política. Mais do que isso, no caso Ao Man Long deixou uma série de assuntos controversos pendentes que tê sido muito debatidos pela opinião pública, o que teve efeitos negativos sobre a imagem de imparcialidade que a comunidade reclama para o detentor do cargo.

Fernando Chui Sai-on é secretário para os Assuntos Sociais e Cultura desde a transferência de administração e são fortes hipóteses de vir a candidatar-se. Talvez os seus laços familiares e a educação numa universidade americana contribuam para que isso aconteça.
Embora a sua história familiar seja bastante semelhante à de Chui Sai-peng, a sua prestação a nível da economia, jogo e sociedade política não lhe dá qualquer vantagem competitiva.

É curioso que tanto Francis Tam, o secretário para a Economia e Finanças, como Florinda Chan, secretária para a Administração e Justiça, estejam também na lista de possíveis candidatos. Parece indicar que o próximo CE deve vir das altas esferas do funcionalismo público, mas, em primeiro lugar, estes nomes não possuem os pré-requisitos, e em segundo lugar falta-lhes excelência de desempenho e popularidade. Observadores políticos ficariam surpreendidos se estes nomes recolhessem o mínimo de nomeações necessário.

Desta análise dos candidatos pode facilmente depreender-se a pobreza da liderança política em Macau. Isso pode dever-se ao isolamento de séculos vivido pela população de Macau e do facto de possuir uma cultura fracamente integrada a nível político e social, que afasta a população das preocupações sociais, deixando-a com um sentimento de impotência face à realidade.
Além disso, os esforços conjuntos envidados desde os anos 60 pelas associações patrióticas tornaram a população de Macau obediente aos seus patronos, pouco reivindicativa e sempre pronta a seguir sem contestar as orientações vindas de cima.
É ridículo constatar que a população local só consiga indicar nomes para possíveis CE em função da sua exposição pública e que quase todos os nomes indicados estejam ligados ao exercício de cargos públicos.
Também preocupante é o entendimento de que o próximo CE vai ter maiores dificuldades no exercício do cargo, uma vez que a população de Macau já não são os cidadãos obedientes que eram sob a administração portuguesa.
Os protestos frequentes que se registaram nos últimos anos, os conflitos entre os agentes da indústria do jogo e o contínuo aumento da exigência no funcionalismo público alertaram Pequim para a necessidade do reforço da eficácia do governo de Macau. Se o terceiro CE não estiver à altura das novas circunstâncias, o mais provável é que tenha que se demitir ou ser afastado uma vez finda a presidência de Hu Jintao.

Bruce Kwong é Professor Assistente no Departamento de Administração da Universidade de Macau.

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