12.02.2008

Causas e prevenção do suicídio em debate no IIUM

Problemas financeiros são factor significativo

O professor Paul Yip esteve ontem no Instituto Inter-Universitário de Macau para apresentar o seu livro "Suicido na Ásia - Causas e Prevenções". O PONTO FINAL conversou com o investigador, responsável por uma equipa de especialistas que tem analisado este fenómeno nos países da região.

Rui Cid

Todos os anos, cerca de 1 milhão de pessoas decide pôr termo à própria vida. Desse impressionante número, 60 por cento dos casos ocorrem na Ásia. A estatística intrigou Paul Yip, professor e director do Centro de Pesquisa e Prevenção do Suicídio de HK, que montou uma equipa de investigadores para conhecer as razões da dimensão do fenómeno no continente asiático. O resultado de anos de trabalho de campo foi recentemente publicado na obra "Suicídio na Ásia: Causas e Prevenções". Ontem, a convite Instituto Inter-Universitário de Macau (IIUM), o professor Paul Yip esteve no território para uma palestra onde deu a conhecer alguns dos pormenores que ajudam a compreender as causas de tão elevada taxa de suicídio nesta parte do globo.
Numa conversa com o PONTO FINAL, antes de se dirigir às cerca de 40 pessoas que se deslocaram ao auditório do IIUM, Paul Yip começou por esclarecer que foram as elevadas taxas de suicídio em alguns países ou regiões asiáticos, com populações relativamente pequenas, que suscitaram maior curiosidade por parte da equipa de investigadores.
"Se tivermos em conta que mais de metade da população mundial vive na Ásia, é compreensível que tenhamos uma percentagem elevada de suicídios. Temos países com populações muito numerosas, como a China, o Japão, a Coreia do Sul, e, claro, a Índia. Contudo, há também outros países ou regiões, onde não vive assim tanta gente, que apresentam taxas de suicídio mais elevadas que alguns países ocidentais. Em Hong Kong, por exemplo, a taxa é de 13 ou 14 suicídios por cada 100 mil habitantes, ao passo que nos Estados Unidos é de 11, na Austrália de 10 e no Reino Unido de apenas 7."
Na posse destes dado, Yip e equipa dividiram-se por 8 países asiáticos para conhecer diferentes realidades. É que, como diz o coordenador da investigação, cada país apresenta causas muito próprias para justificar as taxas de suicídio.
"Perguntam-me muitas vezes quais são as principais causas para uma pessoa decidir pôr termo à própria vida. Eu não gosto de fazer listas, é perigoso generalizar. Não há uma causa principal para o suicídio. Há factores que variam de país para país. Na China, por exemplo, observa-se uma taxa reduzida nas áreas urbanas, enquanto nas zonas rurais essa taxa sobe exponencialmente. Nestas zonas, as pessoas sofrem inúmeras adversidades. O desemprego atinge grandes proporções, o nível de educação, especialmente para as mulheres, é baixo. São locais onde não há grandes oportunidades para os cidadãos. Há uma barreira social que impede as mulheres de procurarem ajuda. Nos países onde concentrámos o nosso estudo, verificámos que os problemas financeiros são um dos factores mais significativos para o suicídio, em comparação com os países ocidentais ", sublinha o investigador.
Contudo, esta é uma situação que se altera se nos dois pratos da balança estiverem só países do continente asiático. Os números mostram que no Japão e na Coreia do Sul, países economicamente desenvolvidos, a taxa de suicídios é tão elevada como nos países em via de desenvolvimento. Dados que levam o professor Yip a insistir em afirmar que não há só um factor que leve uma pessoa a suicidar-se: "Em cada país temos que compreender o seu contexto especifico - A cultura, a disposição demográfica, factores que variam de um país para o outro".

Prevenção

As diferenças na hora de identificar causas e razões para o suicídio obrigam, naturalmente, a que o mesmo principio se aplique quando o assunto em cima da mesa é a prevenção.
Considerando a prevenção como fundamental no trabalho de reduzir ao máximo o número de casos, o professor frisa, todavia, que as investigações desenvolvidas nos últimos anos apontam para a necessidade de redefinir estratégias na abordagem ao problema do suicídio.
"Não há situações milagrosas. Há um conjunto de medidas que podemos tomar. Quando se fala em suicídio, a OMS recomenda uma 'abordagem apropriada'. Quer isso dizer que nos devemos afastar daquela ideia clássica dos problemas clínicos. O que temos verificado é que há inúmeros casos de pessoas que não estavam depressivas nem classificadas como casos clínicos e mesmo assim cometeram suicídio. Por isso, a 'abordagem apropriada' significa tratarmos de maneira diferente o que é diferente", destaca o professor.
Ao PONTO FINAL, Paul Yip revela que as acções de prevenção são divididas em três grandes núcleos - população em geral, grupos de risco, como por exemplo os desempregados, e, por último, pessoas com historial de comportamentos que atentem contra a própria saúde.
"Estas são três 'camadas' onde devemos intervir. E para cada uma delas a abordagem terá que ser diferente. Por exemplo, se estivermos a falar da população em geral podemos pensar em adoptar medidas que dificultem o suicído. No Reino Unido, a venda de comprimidos é feita em pequenas doses, pelo que obter uma dose suficiente para conseguir por termo à vida torna-se complicado. Os dados estatísticos mostram que desde que essa medida entrou em vigor, o número de suicídios por envenenamento sofreu uma assinalável redução."

Fundamental

Se pequenas medidas conseguem ter efeito, a atenção dos médicos e da família pode fazer toda a diferença na hora de salvar uma vida, sublinha Paul Yip. O professor revela que 25 por cento das pessoas que cometeram suicídio procuraram ajuda médica na semana anterior a decidirem por termo à vida. Um grito mudo de socorro que prova que até há lacunas nos departamentos de combate ao suicídio
"O nosso conhecimento ainda não é suficiente. Acontece muitas vez que depois de chegarem ao hospital com cortes, ou mesmo nos casos em que a tentativa de suicídio não foi bem sucedida, as pessoas são mandadas para casa sem que ninguém lhes preste assistência nos dias seguintes. O tratamento acaba no momento em que as pessoas passam a porta do hospital e isso deve mudar. 20 por cento destas pessoas acabam mesmo por pôr termo à vida, e 18 por cento dos suicídios ocorrem na semana seguinte à alta hospitalar. Por isso estamos a desenvolver vários projectos de formação junto dos médicos para que possam mais facilmente detectar pessoas em risco, mas também para os ensinar a ajudarem as pessoas a voltarem a sentir-se ligadas com a sociedade, com a família e amigos. Um dos estados de espírito mais frequentes em pessoas que suicidam é a sensação de que não estão ligadas a nada. Que ninguém se importa com elas. A família também é muito importante para que sintam que há quem goste e se preocupa com elas".
Paul Yp considera ainda que a mudança de mentalidades é fundamental, ou seja as pessoas que precisam de ajuda têm que a solicitar.
"Há muita gente que vê o dinheiro como a coisa mais importante da vida. Quando perdem o dinheiro, perdem tudo. Mas há que os consciencializar que o dinheiro não é tudo. O apoio da família, dos amigos é fundamental para as pessoas se ajudarem umas às outras, para ultrapassarem momentos mais difíceis. Outra coisa importante, caso haja um problema, é que as pessoas não escondam esse facto das outras pessoas. É importante que falem desse problema, que procurem ajuda."

Macau

Na conversa com o PONTO FINAL, Paul Yip revelou que, embora os dados disponíveis relativos ao território não sejam muitos, sabe-se que a taxa de suicídios em Macau - 16 por cada 100 mil habitantes, 70/80 por ano - é ligeiramente superior à média calculada pela Organização Mundial de Saúde. Uma situação que "não é preocupante", considera o professor embora refira que, nos últimos 5 anos, houve um aumento no número de casos no território. O especialista deixa um alerta - com a crise financeira as preocupações vão aumentar.
"De acordo com os nosso estudos, há várias formas de prevenção. Uma delas é tentar criar o maior número possível de empregos. O desemprego, especialmente para os homens, tem um efeito muito negativo. Afecta não só a situação financeira, como também a auto-estima. É muito importante que o governo de Macau crie mais empregos e proteja os direitos dos trabalhadores locais. Neste aspecto, folgo em saber que o governo da RAEM já o está a fazer."

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