12.02.2008

Prazo de duração máxima da prisão preventiva está a chegar ao fim

Familiares de Ao Man Long quase em liberdade

Poderá ser apenas por uns dias, mas o irmão e a cunhada de Ao Man Long deverão sair em liberdade na próxima semana. É que o Tribunal de Segunda Instância admitiu parcialmente os recursos do Ministério Público e de quatro arguidos. Os apelos sobem para a Última Instância e, mesmo que o tribunal decida sobre o caso nos próximos dias, a sentença não terá transitado em julgado a 6 de Dezembro.

Isabel Castro

Faz dois anos no próximo dia 6 que o ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas foi detido. Condenado, entretanto, a uma pena 27 anos de prisão, Ao Man Long não foi o único a ser preso nesse dia de má memória para a história da RAEM: o irmão e a cunhada, o casal Ao Man Fu e Ao Chan Wai Choi, viram-se também privados da liberdade.
Condenados a pesadas penas de prisão pelo Tribunal Judicial de Base (TJB) – 18 anos para Ao Man Fu e 13 para Ao Chan Wai Choi –, os dois familiares do primeiro processo conexo ao do ex-governante viram as penas serem substancialmente reduzidas, no passado dia 30 de Outubro, por decisão do Tribunal de Segunda Instância (TSI).
Não contente com o entendimento deste tribunal, o Ministério Público (MP) recorreu do acórdão – um apelo dirigido ao Tribunal de Última Instância (TUI) que, segundo alguns juristas, não seria processualmente admissível. Acontece que foi. Ao que o Ponto Final apurou, o juiz relator do processo levantou reservas, mas acabou por admitir partes do recurso.
O mesmo magistrado pronunciou-se ainda sobre outros apelos, desta feita por quatro arguidos, sendo que foram igualmente encaminhados para o TUI.
O tribunal presidido por Sam Hou Fai tem agora que distribuir o processo a um juiz que será o relator. Este magistrado judicial (que deverá ser Chu Kin ou Viriato Lima) terá depois que se pronunciar sobre a sua admissibilidade. Mesmo que o faça ainda hoje, já não vai a tempo de evitar que, no próximo dia 6, Ao Man Fu e Ao Chan Wai Choi saiam em liberdade do Estabelecimento Prisional de Macau (EPM).
É que ficam cumpridos dois anos da aplicação da prisão preventiva. De acordo com o Código de Processo Penal (CPP), este é precisamente o prazo máximo para a medida de coacção a que estão sujeitos os familiares do ex-governante. Se o TUI não admitir o recurso do MP, é válida a decisão da Segunda Instância, que condenou Ao Man Fu a cinco anos de prisão e Ao Chan Wai Choi a quatro anos e seis meses. Como são necessários dez dias para que o acórdão transite em julgado, no dia 6 o casal continua a ser inocente aos olhos da lei da RAEM, que só considera um cidadão culpado depois de ter passado este prazo processual.
Em diferentes circunstâncias está o pai do ex-governante: Ao Veng Kong foi detido a 7 de Setembro de 2007, nove meses depois dos filhos e da nora.

A hipótese da reclamação

E se o Tribunal de Última Instância admitir o recurso? A situação é exactamente a mesma – será difícil encontrar um argumento legal para manter Ao Man Fu e Ao Chan Wai Choi atrás das grades enquanto o TUI decide do processo. Há ainda uma outra hipótese a colocar – é bem provável que, se o juiz relator não considerar o recurso admissível, os arguidos reclamem da decisão deste magistrado para a conferência de juízes do tribunal, mecanismo legal de que dispõem.
Segundo fonte do PONTO FINAL, a única possibilidade legal de manter o casal no EPM é que sejam acusados noutro processo – o que, tanto quanto este jornal sabe, não deverá acontecer. Recorde-se que Ao Man Fu e Ao Chan Wai Choi foram arguidos num segundo processo conexo (em que foi condenado o empresário Tang Kin Man), sendo que foram absolvidos das acusações de crimes de branqueamento de capitais pelos quais respondiam.
Se o TUI admitir o recurso, ainda assim tal não significa que o processo volte a julgamento. E isto porque os três juízes que integram a Última Instância podem considerar-se impedidos para julgar, uma vez que já tomaram uma decisão num processo conexo: o de Ao Man Long. O colectivo que julgou o ex-governante contou com um juiz do Tribunal de Segunda Instância, Lai Kin Hong, uma vez que Chu Kin, magistrado judicial do TUI, tinha participado na fase de instrução, e por isso mesmo ficou impedido.
Mais recentemente, para o julgamento em sede de recurso deste processo, o presidente do TSI, Lai Kin Hong, terá invocado impedimento, pelo que o processo foi reavaliado por José Maria Dias Azedo, o juiz relator, Chan Kuong Seng e Choi Mou Pan. Ou seja, Lai Kin Hong terá sentido que, por ter julgado Ao Man Long, já tinha assumido uma posição em relação ao caso.
O CPP determina o impedimento por participação em processo, explicando que “nenhum juiz pode intervir em recurso ou pedido de revisão relativos a uma decisão que tiver proferido ou em que tiver participado, ou no julgamento de um processo a cujo debate instrutório tiver presidido”.
Refere ainda a mesma codificação que “os actos praticados por juiz impedido são nulos, salvo se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo”. A declaração de impedimento pode ser requerida pelos arguidos.
Se os juízes se considerarem impedidos após ter sido admitido o recurso, estar-se-á perante uma situação com contornos semelhantes ao de Ao Man Long – não há para quem recorrer. No caso do ex-secretário, não pôde recorrer decisão tomada em primeira instância pelo TUI. Neste caso concreto, trata-se já do segundo grau de recurso. Em causa não estará apenas o apelo do MP, uma vez que também os familiares de Ao e o empresário Frederico Nolasco da Silva pediram uma reavaliação do acórdão.

Aceite mas não muito

Na altura do julgamento em sede de recurso no TSI, era entendimento de vários juristas que não seria possível recorrer da decisão: o CPP não admite recursos de acórdãos preferidos, em sede de recurso, pela Segunda Instância, em processos por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos. Ou seja, o que conta é a medida abstracta de cada crime e não a medida concreta da pena. Nos casos em concreto – o casal Ao, o pai do ex-secretário, Ao Veng Kong, e os empresários Frederico Nolasco e Chan Tong Sang – entram precisamente nesta norma, uma vez que nenhum dos arguidos foi condenado por crimes com pena máxima superior a oito anos.
O juiz do TSI responsável pelo despacho tem este entendimento e, por isso, não admitiu a parte do recurso que diz respeito ao crime de branqueamento de capitais absolvido a Frederico Nolasco da Silva. É que teria sido cometido em Setembro de 2006, altura em que vigorava já a actual legislação para este tipo de crimes (a Lei nº 2/2006), que determina uma moldura penal entre 2 a 8 anos. Recorde-se que, tal como o PONTO FINAL noticiou, o MP não concordou com a absolvição, pela Segunda Instância, de um dos dois crimes de branqueamento de capitais de que o empresário era acusado, absolvição esta que permitiu, em parte, reduzir a pena de prisão de dez para seis anos.
O Ministério Público tinha ainda mostrado a sua insatisfação em relação à qualificação da conduta dos familiares de Ao Man Long como a prática de um crime de branqueamento de capitais na forma continuada, por considerar que não se verificam todos os requisitos determinados na lei, nomeadamente a existência de uma situação exterior facilitadora da execução dos crimes que demonstre a diminuição da culpa.
Foi por o TSI ter considerado tratarem-se de crimes na forma continuada que os arguidos viram as penas reduzidas substancialmente. Coloca-se a mesma questão jurídica, mas desta feita, há crimes que terão sido cometidos quando estava em vigor a lei anterior que punia os agentes do branqueamento de capitais com penas que podiam chegar aos 12 anos.
O Código Penal determina que, “quando as disposições penais vigentes no momento da prática do facto punível forem diferentes das estabelecidas em leis posteriores, é sempre aplicado o regime que se mostrar mais favorável ao agente”.
Esta norma determina, assim, que a família Ao deverá ser julgada ao abrigo da Lei nº 2/2006, a mais favorável por determinar penas de prisão menos pesadas - e que afasta a hipótese de recurso. Ainda assim, o TUI admite que possa haver outra interpretação das várias questões processuais que se colocam neste ponto do recurso, pelo que o considera admissível, embora o faça com reservas.
O recurso interposto pelo MP também tem como objecto parte da decisão do TSI em relação às indemnizações que Frederico Nolasco da Silva e Chan Tong Sang teriam que pagar. A Segunda Instância decidiu absolver os dois empresários das indemnizações determinadas pelo TJB: Frederico Nolasco da Silva tinha sido condenado ao pagamento de 30 milhões de patacas e Chan Tong Sang a 20 milhões. O TSI não encontrou fundamentação suficiente para justificar os valores.
O MP pretende que esse cálculo seja feito pelo Tribunal de Última Instância. O relator admite o recurso nesta parte, mas diz que a questão suscita dúvidas.

Os apelos dos arguidos

Segundo o que o PONTO FINAL soube, também os elementos da família Ao apresentaram recurso, que foi admitido pela Segunda Instância. O tribunal teve ainda que se pronunciar sobre o apelo feito por Frederico Nolasco da Silva, que não se conformou com a condenação por três crimes de corrupção activa para acto ilícito e um crime de branqueamento de capitais, bem como a declaração de perdimento, a favor da RAEM, de mais de 46 milhões de patacas.
Pela mesma razão que não aceitou o recurso do MP no que ao crime imputado a Frederico Nolasco diz respeito, o relator considera não ser admissível o apelo do arguido para a reponderação dos crimes de corrupção activa para acto ilícito (a pena máxima é inferior a oito anos). Mas admitiu o recurso no que toca à declaração de perdimento dos 46 milhões de patacas, bem como na parte referente ao crime de branqueamento de capitais.
Porque os recursos têm efeitos suspensivos, os empresários Frederico Nolasco da Silva e Chan Tong Sang continuam em liberdade. O administrador da CSR - Macau compareceu em praticamente todas as sessões de julgamento, mas diferente postura teve o patrão da Chong Tit que, ao abrigo de uma norma do CPP, deu autorização para que o processo decorresse sem a sua presença, uma vez que não reside em Macau. Desconhece-se que Chan Tong Sang, condenado a cinco anos e três meses de prisão pelo TSI, tenha interposto recurso ao Tribunal de Última Instância.

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