11.17.2008

MP recorreu do acórdão do TSI relativo aos familiares de Ao Man Long e empresários

Juízes sem impedimento para julgar?

O Ministério Público não ficou satisfeito com a decisão do Tribunal de Segunda Instância e, por isso, decidiu recorrer do acórdão relativo ao três familiares de Ao Man Long e aos empresários Frederico Nolasco e Chan Tong Sang. Resta agora saber se os juízes do Tribunal de Última Instância entendem estar em condições plenas para aceitar o recurso. É que poderá colocar-se a questão do impedimento.

Isabel Castro

É mais uma situação que, a acontecer, será criada pela forma como estão organizados os tribunais da RAEM, sendo que, no caso concreto, o problema estará no número de juízes. Os juízes do Tribunal de Última Instância (TUI) poderão invocar impedimento em relação ao recurso interposto pelo Ministério Público (MP).
De acordo com uma notícia avançada ontem pela Rádio Macau, os três familiares de Ao Man Long e os empresários Frederico Nolasco e Chan Tong Sang, condenados a penas de prisão na sequência do escândalo de corrupção protagonizado pelo ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, continuam a aguardar uma decisão final sobre o processo.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI) reduziu, de forma significativa, a medida das penas definidas pelo Tribunal Judicial de Base. O entendimento do colectivo não terá agradado ao Ministério Público (que se tinha pronunciado, contudo, favorável à diminuição das penas), pelo que recorreu do acórdão proferido no passado dia 30 de Outubro.
Resta agora saber se o TUI vai aceitar a pretensão do MP e avaliar, em segundo grau de recurso, o processo que senta no banco dos réus os familiares de Ao Man Long e os dois empresários. É que os três juízes da Última Instância poderão considerar-se impedidos para o fazer, uma vez que já tomaram uma decisão num processo conexo, explicou ao PONTO FINAL uma fonte conhecedora do caso. Recorde-se que foi o TUI a julgar e a condenar a 27 anos de prisão o antigo secretário para os Transportes e Obras Públicas, uma decisão entendida, no meio jurídico local, como sendo demasiado pesada tendo em conta o facto de Ao ter cometido crimes económicos, e não de sangue.
O colectivo que julgou o ex-governante contou com a presença de um juiz do Tribunal de Segunda Instância, Lai Kin Hong, uma vez que Chu Kin, magistrado judicial do TUI, tinha participado na fase de instrução. Diz o Código de Processo Penal (CPP), em vigor desde 1996, que “quando a competência para a instrução pertencer ao Tribunal Superior de Justiça, o instrutor é designado, por sorteio, de entre os juízes da secção e fica impedido de intervir nos subsequentes actos do processo”.
A questão voltou a colocar-se mais recentemente: para o julgamento em sede de recurso do processo dos familiares de Ao Man Long, o presidente do TSI, Lai Kin Hong, terá invocado impedimento, pelo que o processo foi reavaliado por José Maria Dias Azedo, o juiz-relator, Chan Kuong Seng e Choi Mou Pan. Ou seja, Lai Kin Hong terá sentido que, por ter julgado Ao Man Long, já tinha assumido uma posição em relação ao caso.
O CPP determina o impedimento por participação em processo, explicando que “nenhum juiz pode intervir em recurso ou pedido de revisão relativos a uma decisão que tiver proferido ou em que tiver participado, ou no julgamento de um processo a cujo debate instrutório tiver presidido”. Refere ainda a mesma codificação que “os actos praticados por juiz impedido são nulos, salvo se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo”. A declaração de impedimento pode ser requerida pelos arguidos.
O CPP dispõe também que “a intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade”.
Há agora que esperar para perceber qual a leitura jurídico-penal que Chu Kin, Sam Hou Fai e Viriato Lima (os outros dois juízes que integraram o colectivo responsável pelo julgamento do ex-secretário) farão em torno da questão do impedimento que porventura venha a suscitar-se. Ao Man Long, condenado por corrupção passiva, foi julgado num processo diferente daquele em que foram arguidos os corruptores, devido ao facto de integrar o Executivo da RAEM à altura da prática dos crimes.

Os crimes da lei antiga

A decisão do TSI em relação a Ao Veng Kong, Ao Man Fu e Ao Chan Wai Choi (pai, irmão e cunhada de Ao Man Long), bem como a Frederico Nolasco da Silva e a Chan Tong Sang, empresários acusados por crimes de corrupção activa e branqueamento de capitais, foi bem mais “suave” que a do TJB. Dos cinco arguidos, Ao Man Fu foi o mais beneficiado pela nova avaliação do processo: tinha sido condenado pelo colectivo presidido por Alice Costa a 18 anos, mas a Segunda Instância diminuiu a pena de prisão efectiva para cinco anos.
Com o recurso apresentado pelo MP, o acórdão ainda não transitou em julgado, pelo que Frederico Nolasco e Chan Tong Sang continuam em liberdade. O dono da Chong Tit, que viu a sua pena reduzida de sete anos de prisão para cinco anos e três meses, não chegou a comparecer em tribunal, uma vez que, ao abrigo do CPP, deu autorização para que o julgamento decorresse sem a sua presença. O casal Ao Man Fu e Ao Chan Wai Choi continuam em prisão preventiva, no Estabelecimento Prisional de Coloane. O mesmo sucede com Ao Veng Kong que está, no entanto, detido na cela prisional do Centro Hospitalar Conde de São Januário, por se encontrar doente (o octogenário sofre de cancro há já alguns anos).
Não se esperava que pudesse haver recurso do acórdão do Tribunal de Segunda Instância. E isto porque o CPP não admite recursos de acórdãos preferidos, em sede de recurso, pelo TSI, em processos por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos. Ou seja, o que conta é a medida abstracta de cada crime e não a medida concreta da pena.
Nos casos em questão, e de acordo com fonte do PONTO FINAL, o Ministério Público terá interposto recurso com base no facto de determinados crimes de branqueamento de capitais terem sido praticados antes da entrada em vigor da Lei nº 2/2006. Até à aprovação desta legislação, o diploma que se pronunciava sobre o branqueamento de capitais previa situações em que a pena de privação de liberdade chegava aos 10 anos.
Ontem, o Tribunal de Segunda Instância pronunciou-se sobre um pedido de aclaração do acórdão de 30 de Outubro, requerido por todos os envolvidos no processo: os três familiares de Ao Man Long, Frederico Nolasco da Silva e Chan Tong Sang, mas também a Companhia de Construção e Engenharia San Meng Fai, Ho Meng Fai (em paradeiro desconhecido, o seu mandatário judicial tinha interposto recurso referente a decisões tomadas pelo TJB durante o julgamento) e Leong Fong In, mulher de Ho Meng Fai. Segundo o site do tribunal, que não publica as razões da decisão, o pedido foi indeferido.
A Rádio Macau indicou também ontem que este pedido de aclaração, no que à defesa de Frederico Nolasco da Silva diz respeito, foi feito por Ricardo Carvalho, uma vez que o advogado do empresário já não é Luís Almeida Pinto.

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