11.12.2008

Os livros e os autores de Macau reunidos em Lisboa

O lugar de todas as escritas

Macau é mais do que um lugar, é uma "constelação de sentidos", diz a organização do colóquio "Macau na Escrita, escritas de Macau", que decorreu no final de Outubro em Lisboa. Com especialistas de vários continentes.

João Paulo Meneses
putaoya@hotmail.com

Para quem acha que em Portugal não há interesse pelo que se passa em Macau, o Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa deu recentemente mais uma boa resposta.
Duas dezenas de especialistas participaram num colóquio chamado "Macau na Escrita, Escritas de Macau", que juntou muitos portugueses mas também investigadores que, um pouco por todo o mundo, se interessam pela raiz literária de Macau.
A organização foi de Lourdes Câncio Martins e de Ana Paula Laborinho, o que confirma a regra de que quem esteve em Macau não esquece Macau quando regressa.
Porventura em Macau não existirá a noção de que, da Universidade de Bristol (Inglaterra) à de São Paulo, de Florença a Montepelier (França), há estudiosos que se interessam pelo que acontece ou aconteceu ao nível literário em Macau.
E não se pense que são casos isolados, de um ou outro investigador que teima em alimentar um "bizarria": da Universidade de Florença vieram dois estudiosos, falar por exemplo de temas tão diversos como o projecto missionário do P. António de Gouvea ou a narrativa de Maria Ondina Braga.
Também de Bristol vieram dois investigadores, com a curiosidade de um ser português, o antigo leitor de português em Pequim Gustavo Infante. O outro é, nem mais nem menos, do que uma das maiores autoridades mundiais na matéria, David Brookshaw, a quem foi dada a honra de abrir, com uma intervenção sobre "A circunstância da escrita ou a escrita de circunstância: a literatura de Macau".

Pessanha, Wenceslau mas não só

Da Universidade de Macau, na sessão do primeiro dia, veio Yao Jing Ming, que abordou o tema "Em busca do habitável: poetas contemporâneos de Macau", mas o interessante, nestas circunstâncias, é que a organização conseguiu juntar quem, fora de Macau, pensa em Macau.
A maior parte dos especialistas teve origem em Portugal.
Além de Ana Paula Laborinho, que falou sobre "Macau e a escrita: tópicos de uma problemática", intervieram, com documentos escritos, Ana Paula Avelar (da Universidade Aberta), que falou sobre o conceito de "Orientalismo nos 1ºs escritos portugueses sobre a China e Macau", Serafina Martins (da Universidade de Lisboa), sobre Camilo Pessanha ("O poeta e a sua personagem") e, da mesma universidade, Maria José Grosso ("o Olhar sobre as línguas nas escritas de Macau").
Ainda relativamente à sessão do dia 21 de Outubro, há a registar a participação de Cynthia Schlappi, da Universidade Paul-Valéry-Montpellier III), que falou sobre "Wenceslau de Moraes em Macau: uma escala de dez anos na península chinesa", e de Mónica Simas, da Universidade de São Paulo, que abordou o tema "Macau entre rostos e arestas".

Destaque para Maria Ondina Braga

No segundo e último dia, o destaque vai para um painel exclusivamente dedicado à escritora Maria Ondina Braga, já falecida.
Michela Graziani, de Florença, abordou "Culturas em diálogo: Ocidente e Oriente na narrativa de Maria Ondina Braga", Maria João Simões (da Universidade de Coimbra) falou sobre "Percursos macaenses das personagens de Maria Ondina Braga" e Dora Gago (Aveiro) trouxe ao colóquio "Alteridade e identidade em Nocturno em Macau de Maria Ondina Braga".
Neste segundo dia houve mais contributos da Universidade de Macau, já que Ana Cristina Alves falou sobre "Lendas de Macau nos nossos dias" e Rogério Miguel Puga desenvolveu mais uma vertente dos seus estudos sobre autores de língua inglesa e Macau ("Intertextualidade e Representações de Macau em City of Broken Promises, de Austin Coates, Tai-pan de James Clavell e An Insular Possession de Timothy Mo").
Também com ligação a Macau (e à Universidade local), pelo menos no passado, Raul Leal Gaião trouxe ao colóquio o tema "Imagens e encontros com o Oriente".

"Macau excede a nomeação de um lugar"

Incluído no colóquio, realizou-se uma mesa-redonda com escritores: António Osório, António Rebordão Navarro, Fernanda Dias, Gil de Carvalho, João Aguiar e Yao Jing Ming (que, como se viu, também foi um dos oradores). Curiosidade para o facto de a poetisa Fernanda Dias ter sido motivo para uma das intervenções, a de Gustavo Infante, que falou sobre "Os contos de Deolinda da Conceição e Fernanda Dias: contributo para a imagética do feminino oriental em língua portuguesa".
Os participantes, oradores ou apenas interessados, puderam visitar a exposição que tinha o nome do colóquio internacional, "Macau na Escrita, Escritas de Macau" e que decorreu nas instalações da Faculdade de Letras, mas também uma outra, na Delegação Económica e Comercial de Macau, sobre "Alberto Estima de Oliveira (1932-2008): um poeta de Macau".
Para a organização, "lugar habitado e visitado por viajantes europeus desde os primórdios da presença portuguesa, estabelecida em meados de 1550, plataforma de comunicação entre mundos, Macau excede em significado a nomeação de um lugar e da sua história para se converter em constelação de sentido(s) expresso(s) ao longo de séculos, em diferentes línguas, na escrita de autores que ali nasceram, viveram ou passaram". Por isso, "o colóquio “Macau e a escrita, escritas de Macau” convoca o interesse que tem despertado o estudo de Macau e a Literatura em Universidades de vários continentes, testemunhado por recentes publicações, teses de mestrado e doutoramento, bem como pesquisas em curso". O objectivo da iniciativa era "incentivar o desenvolvimento de novas metodologias de pesquisa, susceptíveis de mobilizar investigadores de diferentes áreas disciplinares. Visa também reunir uma diversidade de experiências culturais e científicas que permitam estruturar um domínio de estudos ainda dispersos com incidência em Macau e a escrita"

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